DO PACTO DE DEUS COM O HOMEM
Seção I
Tão
grande é a distância entre Deus e a criatura, que, embora as criaturas
racionais lhe devam obediência como ao seu Criador, nunca poderiam fruir
nada dele como bem-aventurança e recompensa, senão por alguma
voluntária condescendência da parte de Deus, a qual foi ele servido
significar por meio de um pacto.
De início vemos temos que partir com alguns pressupostos tais como: A
transcendência do Senhor Deus; A limitação humana com respeito ao seu
relacionamento com Deus que é totalmente dependente da Revelação; A
mediação de Cristo; A Revelação de Deus para o homem sem a qual o ser
humano jamais poderia conhecer qualquer verdade sobre a vontade do
Senhor apesar da revelação natural;[1] o dever que o homem tem de
cultuar ao Senhor. É importante ressaltar esses pontos, pois eles entre
outros compõe a cosmovisão dos autores desse documento. Vamos ao
comentário da seção I:
Deus é o
totalmente outro. Esta verdade é conhecida por quase todas as
religiões,[2] pode não ser tão bem formulado assim, e normalmente não é,
mas ninguém escapa de tal realidade, por causa da mente pecaminosa do
ser humano ele tenta fugir disso usando de uma religião que é fruto de
sua imaginação ou até mesmo negando, mas uma coisa é certa não podemos
escapar ilesos a essa verdade. Se observarmos bem “Deus é o totalmente
outro” tal sentença gera no homem angústia e desespero pois não podemos
de forma alguma “ir” até Ele, o Senhor está distante sem qualquer
possibilidade de fluirmos bem algum Dele, esse é exatamente o sentimento
observado no mundo moderno ou melhor em todas as eras, mas o Niilismo
moderno deu uma significação filosófica a esse sentimento que o homem
caído tem e quando adentra a esfera da teologia destrói qualquer
possibilidade de significação da Revelação. Um dos resultados foi a
chamada teologia liberal clássica hoje em desuso (será?), que foi
combatida por vários teólogos entre eles o conhecidíssimo Karl Barth que
fez frente ao niilismo teológico, luta iniciada com o seu comentário da
carta de Paulo aos Romanos, “O Deus da Epístola aos Romanos é o Deus
absconditus, o totalmente Outro (das ganz Andere), conceito que Barth
extrai de Rudolf Otto, inserindo-o, porém, não em um contexto
fenomenológico, e sim teológico. Nenhum caminho vai do homem a Deus: nem
a vai da experiência religiosa (Scheleirmacher), nem a da história
(Troeltsch), e tampouco uma via metafísica; o único caminho praticável
vai de Deus ao homem e se chama Jesus Cristo.”[3]
Através
de Cristo e só por Ele somos resgatados de tão horrível situação há
única solução para o distanciamento de Deus e sua criatura é o Pacto
estabelecido entre Criador e criatura que é mediado por Cristo O Agente
pactual.[4] É justamente isso que os nossos pais na fé tinham em mente
quando afirmaram a seção I, que o homem em seu estado natural não pode
estabelecer qualquer tipo de comunhão com Deus, tendo em si mesmo a
semente da religião,[5] deve obediência e culto ao seu Criador
sentindo-se o homem impelido à adoração, constrói meios de acesso Deus
Criador, mas por não contar com uma revelação proposicional, não pode
encontrar elementos que o direcione a culto que possa satisfazer a
vontade de Deus, comete idolatria, pois utiliza apenas o dados sensíveis
da criação e a interpreta a luz de sua realidade caída, ele adora
apenas a um deus que é apenas uma projeção do seus ser, o homem natural
adora a si mesmo e em sua arrogância o chama de deus, colhendo frutos
terríveis de idolatria; morte e ainda mais confusão, Deus de forma
condescendente estabeleceu o pacto para que possa o homem que é
resgatado fluir de bem-aventurança e recompensa.
Seção II e III
O
primeiro pacto feito com o homem era um pacto de obras; nesse pacto foi
a vida prometida a Adão e nele à sua posteridade, sob a condição de
perfeita obediência pessoal.
O
homem, tendo-se tornado pela sua queda incapaz de vida por esse pacto, o
Senhor dignou-se fazer um segundo pacto, geralmente chamado o pacto da
graça; nesse pacto ele livremente oferece aos pecadores a vida e a
salvação por Jesus Cristo, exigindo deles a fé nele para que sejam
salvos; e prometendo dar a todos os que estão ordenados para a vida o
seu Santo Espírito, para dispô-los e habilitá-los a crer.
O termo “pacto de obras” tem levantado certos questionamento ao longo
dos séculos, foi o teólogo puritano inglês Dudley Fenner (1558-1587)
mais tarde sendo convertido para o latim foedus operum,[6]foi com Thomas
Cartwringht(1535-1603), que posteriormente ensina essa doutrina no
continente sendo cristalizada nos símbolos de fé reformados do século
17.[7] O pacto de obras tem despertado certos questionamentos ao longo
desse tempo, as opiniões variam desde defesa até a completa negação.[8]
Mas vale ressaltar que o fé cristã tornaria sem sentido se o pacto de
obras não fosse uma realidade tanto no passado com Adão quanto com os
seus descendentes.
A violação do
pacto das obras, por Adão e Eva, tornou as promessas do pacto
inacessíveis aos seus descendentes. Essas promessas foram canceladas por
Deus, o qual não pode aviltar Seu padrão da lei, redistribuindo o pacto
das obras para creditar a injustiça do homem caído. Entretanto, o
cancelamento divino não anula a demanda de Deus por obediência perfeita.
Antes, em razão da estabilidade da promessa de Deus e de sua lei, o
pacto das obras se torna efetivo em Cristo, o perfeito cumpridor da lei.
Ao cumprir todas as condições do pacto da graça, Cristo cumpriu todas
as condições do pacto das obras.[9]
Vemos
que a verdade do pacto das obras é fundamental para entendermos a obra
substitutiva de Cristo, Paulo torna ainda mais evidente isso em sua
carta aos Romanos (Rm 5.12-21). Por isso é fundamental dependermos do
nosso Senhor Jesus, que obedece as cláusulas da lei de forma perfeita,
já Adão e seus descendentes não cumpriram os termos do acordo, sendo a
vida recebida pela obediência do nosso Representante Maior; Cristo, Deus
cumpre a promessa de dar vida em Cristo. Toda glória ao Deus bendito.
Seção IV
Este
pacto da graça é frequentemente apresentado nas Escrituras pelo nome de
Testamento, em referência à morte de Cristo, o testador, e à perdurável
herança, com tudo o que lhe pertence, legada neste pacto.[10]
Seção V e VI
Este
pacto no tempo da Lei não foi administrado como no tempo do Evangelho.
Sob a Lei foi administrado por promessas, profecias, sacrifícios, pela
circuncisão, pelo cordeiro pascoal e outros tipos e ordenanças dadas ao
povo judeu, prefigurando, tudo, Cristo que havia de vir; por aquele
tempo essas coisas, pela operação do Espírito Santo, foram suficientes e
eficazes para instruir e edificar os eleitos na fé do Messias
prometido, por quem tinham plena remissão dos pecados e a vida eterna:
essa dispensação chama-se o Velho Testamento.
Sob
o Evangelho, quando foi manifestado Cristo, a substância, as ordenanças
pelas quais este pacto é dispensado são a pregação da palavra e a
administração dos sacramentos do batismo e da ceia do Senhor; por estas
ordenanças, posto que poucas em número e administradas com maior
simplicidade e menor glória externa, o pacto é manifestado com maior
plenitude, evidência e eficácia espiritual, a todas as nações, aos
judeus bem como aos gentios. É chamado o Novo Testamento. Não há, pois,
dois pactos de graça diferentes em substância, mas um e o mesmo sob
várias dispensações.
Poderíamos chamar essas duas seções de promessa e cumprimento, no
sentido de que vemos o desenvolvimento progressivo da revelação
acontecer ao longo do Antigo Testamento. Essas duas seções ensinam que
há um só pacto que é administrado de modos diferentes ao longo da
revelação bíblica, na economia da aliança novos elementos são
acrescentados sem desmentir os elementos anteriores, um exemplo disso é a
circuncisão que no antigo testamento era o sinal externo de uma
realidade espiritual este sacramento hoje na nova aliança é administrado
sob a forma de batismo ampliando assim sua aplicabilidade que antes era
restrita aos homens.
Na medida do
progresso da revelação e desenvolvimento da aliança vemos cada vez mais
luz sendo lançada,[11] há um só pacto que é desenvolvido sucessivamente e
plenamente revelado em Cristo.[12]
Conclusão
A doutrina do pacto é sem dúvida uma das mais belas de toda Bíblia, ela revela aspectos importantes do caráter de Deus e de como Ele se compadeceu de suas criaturas revelando amor e misericórdia ao seu povo, e como Ele tomou a iniciativa em relacionar-se conosco.
Bibliografia
BEEKE, Joel R. e JONES Mark. A Puritan Theology, Grand Rapinds: Reformation Heritage books, 2012, 1054 p.
COENEN, Lothar e BROWN, Colin(orgs). Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento 2ªed vol 1, São Paulo: Vida Nova, 2007, 1360p.
DOUGLAS, J. D.(org). O Novo Dicionário da Bíblia 3ªed, São Paulo: Vida Nova, 2006, 1397p.
EICHRODT, Walther. Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Hagnos, 2004, 966p.
HARRIS, R. Laird (org). Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1998, 1789p.
HODGE, A. A. Confissão de Fé de Westminster comentada por A. A. Hodger 3ªed, São Paulo: Os Puritanos, 2010, 596p.
KITTEL, Gerhard e FRIEDRICH, Gerhard(orgs). Dicionário Teológico do Novo Testamento vol 1, São Paulo: Cultura Cristã, 2013, 768p.
ROBERTSON, O Palmer. O Cristo dos Pactos 2ªed, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, 240p.
TURRETINI, François. Compêndio de Teologia Apologética vol 2, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, 864p.
VANGEMERAN, Willem A.(org). Novo Dicionário Internacional de Teologia e Exegese do Antigo Testamento, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, 1168p.
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TURRETINI, François. Compêndio de Teologia Apologética vol 2, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, 864p.
VANGEMERAN, Willem A.(org). Novo Dicionário Internacional de Teologia e Exegese do Antigo Testamento, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, 1168p.
Notas de rodapé
[1] Vide seção I capítulo 1 CFW.
[2] Há religiões onde há uma confusão/mistura entre o aspecto transcendente e imanente do ser divino não é muito bem distinguido tais como as religiões animistas, panteístas, paneteístas. De alguma forma o ente divino que é transcendente se harmoniza ao eixo da estrutura da criação não possibilitando uma distinção essencial entre a divindade e o “deus”, por isso a frase “tudo é deus”, essa frase demonstra uma contradição lógica, posso demonstra uma delas: quando falamos que um ente “É” esse mesmo ente não pode por definição estar dentro do eixo estrutural do tempo e sofrer modificação de qualquer natureza, um ente não pode estar num fluxo do devir e na mesma realidade “É”. Para um maior entendimento da matéria ver o artigo : “A insustentável Irrelevância do Ser”, autor: Edson Matias.
[3] GIBELLINI, Rosino, A Teologia do Século XX, 2a. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2002, p. 21.
[4] Ao longo da Revelação, Deus escolheu vários agentes pactuais os quais foram os quais tipifica o Cristo. Mais na frente será tratado mais detalhadamente desse assunto.
[5] Para mais explicação sobre o tema ler: Institutas 1.III.I; Rm 1.19; 2.14-16.
[6] BEEKE, Joel R.; JONES MARK, A Puritan Theology, Grand Rapids: Reformation Heritage Books, 2012, p. 218.
[7] Ibid.
[8] Por se tratar de um trabalho introdutório não será tratado aqui o desenvolvimento da doutrina, tal análise será feita de forma detalhada em uma posterior monografia do mesmo autor.
[9] BEEKE, Joel, Espiritualidade Reformada, são José dos campos: Fiel, 2014, p. 445.
[10] Para mais detalhes ver introdução, essa seção trata basicamente da nomenclatura.
[2] Há religiões onde há uma confusão/mistura entre o aspecto transcendente e imanente do ser divino não é muito bem distinguido tais como as religiões animistas, panteístas, paneteístas. De alguma forma o ente divino que é transcendente se harmoniza ao eixo da estrutura da criação não possibilitando uma distinção essencial entre a divindade e o “deus”, por isso a frase “tudo é deus”, essa frase demonstra uma contradição lógica, posso demonstra uma delas: quando falamos que um ente “É” esse mesmo ente não pode por definição estar dentro do eixo estrutural do tempo e sofrer modificação de qualquer natureza, um ente não pode estar num fluxo do devir e na mesma realidade “É”. Para um maior entendimento da matéria ver o artigo : “A insustentável Irrelevância do Ser”, autor: Edson Matias.
[3] GIBELLINI, Rosino, A Teologia do Século XX, 2a. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2002, p. 21.
[4] Ao longo da Revelação, Deus escolheu vários agentes pactuais os quais foram os quais tipifica o Cristo. Mais na frente será tratado mais detalhadamente desse assunto.
[5] Para mais explicação sobre o tema ler: Institutas 1.III.I; Rm 1.19; 2.14-16.
[6] BEEKE, Joel R.; JONES MARK, A Puritan Theology, Grand Rapids: Reformation Heritage Books, 2012, p. 218.
[7] Ibid.
[8] Por se tratar de um trabalho introdutório não será tratado aqui o desenvolvimento da doutrina, tal análise será feita de forma detalhada em uma posterior monografia do mesmo autor.
[9] BEEKE, Joel, Espiritualidade Reformada, são José dos campos: Fiel, 2014, p. 445.
[10] Para mais detalhes ver introdução, essa seção trata basicamente da nomenclatura.
Edson Matias
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